Mais um trabalho original para vocês, caros leitores. Este é um roteiro para um scifi televisivo, com toques de suspense e terror, e ainda guarda parte da formatação original em que um roteiro é escrito, que difere em muito de textos romanceados. Repare por exemplo que as falas não tem travessão, mas são antecedidas pelo nome do personagem que fala. Espero que vocês se divirtam, e, quem sabe deixem suas imaginações fluirem de tal maneira que lendo este roteiro, se vejam investigando a miteriosa nave desgarrada junto com os protagonistas, e tomem um ou dois sustos... ;-)
Roteiro Original de: Wagner RMS & Flávio Langoni.
(*) Aqueronte: Filho de Hélios e de Gaia, foi transformado em rio e precipitado nos infernos como punição para uma antiga falha; tinha fornecido água aos Gigantes quando estes lutavam contra Zeus (Júpiter). Suas águas são amargas, lodosas e burbulhantes. Transportados pela barca de Caronte (Queronte, Caron, Charonte, Charon), os mortos devem atravessar este rio para atingirem a morada definitiva. Também chamado de rio Styx.
Canto III - A Divina Comédia - O rio Aqueronte:
Por mim se vai à cidade dolente, Por mim se vai à eterna dor, Por mim se vai à perdida gente. Justiça moveu o meu alto criador, Que me fez com o divino poder, O saber supremo e o primeiro amor. Antes de mim coisa alguma foi criada Exceto coisas eternas, e eterno eu duro. Deixai toda esperança, vós que entrais!
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"PARTE I
GÊNESE: NAVEGANDO EM AQUERON
O INÍCIO DO SÉCULO 22"
O VAZIO ENTRE OS PLANETAS, ONDE UMA ESFERA BERNAL, HABITÁCULO DE AÇO, GIRA LEVANDO EM SEU INTERIOR CIENTISTAS E HOMENS DE FÉ, QUE QUEREM ATINGIR O CAMINHO ENTRE OS MUNDOS.
No casco, por enquanto polido, da esfera, lemos uma série de traduções, para várias línguas, da palavra “Fé”. Terminamos confrontando a palavra em português. Então nos afastamos e vemos o todo, e a esfera gira, lentamente, enquanto sua superfície reflete tanto a luz do sol mais próximo, quanto a suave radiância das estrelas distantes. Uma série de torretas alinhadas em sua linha do equador parece incandescer lentamente, enquanto vozes no rádio conversam com uma distante e oculta base:
ESFERA:
“Estão nos ouvindo? O sistema de criptografia online está funcionando bem? Essa é a comunicação número seis. Depois dos dois meses de silêncio de rádio, estamos prontos e vamos abrir os portões agora. O núcleo sofreu ondulações, mas está operacional, e as torres de dissipação de campo estão se aquecendo, a qualquer momento o rajada de plasma-quantum deve abrir o canal de contato entre as branas.”
BASE DE OPERAÇÕES DO PROJETO AQUERON – GUIANA FRANCESA:
“O sistema está permitindo comunicação indistinguível do ruído de fundo do espaço. Mas aqui o decodificador está funcionando muito bem, recebemos sua transmissão de número seis claramente. Desejamos boa sorte, que vocês encontrem A Verdade...”
As torretas estão acesas, e um campo de distorção se forma em torno do equador da esfera, e se expande, cobrindo lentamente a superfície da esfera...
ESFERA:
“Amém. Muito bem, o campo se formou e está estáv... E a qual... Disparo de plasma... Devem estar ocorrendo distorções... Rádio... Todos estamos muito felizes!”
As torretas subitamente explodem, em sequência, silenciosamente, e o campo que cobria a esfera vai escurecendo, até que se percebe que a esfera desaparece lentamente.
BASE DE OPERAÇÕES DO PROJETO AQUERON – GUIANA FRANCESA:
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"PARTE II
O VAZIO: ENTRE A TERRA E A LUA
PRÓXIMO AO FIM DO SÉCULO 22"
VISTA DO ESPAÇO, EM PANORÂMICA, MOSTRANDO A LUA EM PRIMEIRO PLANO, E À DISTÂNCIA, O PLANETA TERRA.
Pode-se observar estrelas fulgurantes que se movem de cá para lá, que nada mais são que o rastro de poderosos foguetes das naves em tráfego entre a Terra e seu satélite. Vozes no rádio parecem entretidas em monótonos diálogos, controlando o ir e vir de naves. Subitamente, vinda da noite eterna, uma forma sombria e esférica começa a eclipsar a lua, e as vozes no rádio se exaltam:
CONTROLE DE VOO WELLS VILLAGE – LUA:
“Aqui é o Controle de Tráfego da base lunar Wells Village. Temos um estranho no radar. Tem algum veículo de carga a zero-sete-zero da elíptica que não se identificou?”
CARGUEIRO LANÇADOR MAGNÉTICO VESTA:
“Wells, aqui é nave de carga Vesta RX 7792. Essa não era minha janela de lançamento? Tem mais alguém lá?”
Há uma pausa. Enquanto a esfera, lentamente, cobria toda a lua, tomava mais e mais substância, como que solidificando, feita de alguma massa escura como o vácuo, que vai tomando a forma e o peso de aço em lâminas enegrecidas e semidestruídas. Pode-se perceber que a imensa esfera deixa um rastro de pequenos objetos, pedaços de sua couraça que parece se desfazer lentamente. Então os diálogos de rádio recomeçam:
ESTAÇÃO DE ÓRBITA INTERMEDIÁRIA TSIEN:
“Aqui é a estação Tsien RY 33, falando. O que vocês tem aí, em 0-7-0, Wells? Nossos detectores gravimétricos apontam uma grande massa vindo em direção à rota de Camberra. É um meteoro?”
NAVE DE TRANSPORTE TERRA-MARTE ABRAHAM LINCON:
“Até daqui podemos ver a coisa! Somos a Lincon RX 3459 e estamos a 0-2-3, e podemos ver a esfera daqui. De quem é? Não é americana.”
CARGUEIRO LANÇADOR MAGNÉTICO VESTA:
“Wells, da Vesta de novo. Suspendam os lançamentos. Tirem todo mundo daí.”
ESTAÇÃO DE ÓRBITA INTERMEDIÁRIA TSIEN:
“Ela vem direto prá nós! Se resvalar em nós lança a Tsien sobre vocês, Wells, se o choque for direto, explodimos sobre o Amazonas. Tirem essa merda dali! Vai acabar matando muita gente!”
CONTROLE DE VÔO WELLS VILLAGE – LUA:
“Calma, Tsien. Vocês são a prioridade. O pessoal da Busca e Salvamento já foi acionado. Calma! Temos... Cerca de 12 horas para o primeiro impacto. Vai tudo correr bem...”
O ponto de vista se desloca, girando pelo espaço, indo direto contra a luminância radiante do sol. As vozes no rádio, agitadas e nervosas, vão se calando lentamente, como que perdidas na escuridão que ficou para trás.
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"PARTE III
NAS SENDAS ESCURAS: SOB O UMBRAL
6 HORAS E 27 MINUTOS PARA O PRIMEIRO IMPACTO "
A INTENSA LUZ SOLAR SE CONVERTE NOS FOGUETES DE DESACELERAÇÃO DE UMA NAVE DA FORÇA DE BUSCA E SALVAMENTO, QUE SE APROXIMA DA ESFERA, QUE AINDA MANTÉM SEU ASPECTO DESGASTADO E SOMBRIO. ELA É UM “PLANETA MORTO”.
A primeira nave destacada pela Força de Busca e Salvamento gira no espaço, e com pequenos jatos de manobra se posiciona exatamente sobre o polo da esfera, ganhando rotação para se equalizar com a rotação dela. Com um pequeno empuxo de seus jatos principais avança, indo acoplar o anel de atracação em sua proa ao disco de contato da esfera. Mais uma vez por rádio, se ouve o piloto da nave recém chegada dizendo:
COM. DARIO REIS – NAVE DE BUSCA E SALVAMENTO ABADDÓN RX4:
“Controle da missão, aqui é a Abaddón RX4, comandante Reis, conseguimos uma atracação perfeita com a esfera, as alterações feitas pelo tenente Mebarak funcionaram com o sistema antigo da esfera. Temos permissão para abordagem?”
CONTROLE DA MISSÃO DE BUSCA E SALVAMENTO:
“Abaddón RX4, estamos usando a antena do Maranhão, se perceberem algum desvio de frequência, não se alarm... A antena sul-africana está em repar... Congratulações pelo voo plano, e em resposta a sua pergunta: permissão concedida. Boa sort... Em cerca de meia hora a segunda nave deve chegar aí, e... Precisar de acesso por uma escotilha, já que... Confirma que a esfera só tem um anel de atracação.”
COM. DARIO REIS – NAVE DE BUSCA E SALVAMENTO ABADDÓN RX4:
“Estamos tendo falhas de rádio, sim. Existe um radiofarol na esfera emitindo um pulso confuso, isso deve estar atrapalhando ainda mais as comunicações. Vamos entrar os dois, e Mebarak acha que a cerca de vinte e cinco metros temos uma escotilha de fácil acesso para o pessoal da segunda nave. Já podem confirmar qual foi a segunda nave destacada para cá?”
CONTROLE DA MISSÃO DE BUSCA E SALVAMENTO:
“Já... RX7... Partiu... Ela... Lua...”
COM. DARIO REIS – NAVE DE BUSCA E SALVAMENTO ABADDÓN RX4:
“A interferência de rádio está aumentando. Vamos abordar imediatamente a esfera e tentar identifica-la e desativar este radiofarol em curto. Daqui a duas horas nós emitiremos um relatório por pulso de maser. Abaddón RX4 desligando.”
A escuridão cinzenta do interior da esfera parece transpirar uma dor antiga e esquecida, mas ainda viva. As imagens são obscuras e difusas, imersas em uma escuridão opressiva, espessa, parece que percorremos um pequeno e lúgubre corredor, ou, para a imaginação tocada pelo medo, parece que descemos pela garganta monstruosa de uma criatura que nos devora. Então, subitamente, um som metálico, um ranger, uma lâmpada tremeluzente e de um verde desgastado pisca duas vezes, e uma fresta de luz, bem no meio do campo de visão, se forma e se expande. À volta dela temos a sensação de que, junto com o negrume, coisas escuras e fugidias se encolhem e correm da luz que entra, podemos ouvir mesmo, quase no limite entre o som e o silêncio, um choramingar, gritos muito distantes talvez, e um esgar horrendo que parece demonstrar todo o terror que aquele lugar escuro oculta. A perspectiva gira. Não estávamos descendo, mas subindo, do interior para o casco polar da esfera. É a escotilha, a porta de acesso do compartimento estanque do anel de atracação, sendo aberta pelos dois homens da Abaddón que estão entrando. Eles usam trajes pressurizados, flutuando mansamente, na ausência de gravidade do eixo da esfera, e têm somente as luzes que carregam para se guiarem no escuro. No rastro do facho de luz, as coisas obscuras se retorcem e se encolhem, fugindo.
COM. DARIO REIS:
“Ramon! Viu aquilo?”
TEN. RAMON MEBARAK:
“O quê? Não, não, desculpe, eu estava prestando atenção ao sensor atmosférico. Tem ar aqui. Está embolorado, mas respirável. O que foi que viu?”
COM. DARIO REIS:
“Esquece. Se tem ar, tem som... Esse lugar parece morto, mas talvez tenha alguém por aqui. Esse poço sem gravidade deve seguir direto até o núcleo da esfera. Será que dá para ouvir alguma coisa?”
TEN. RAMON MEBARAK:
“Vou ligar o receptor de som externo do meu traje...”
COM. DARIO REIS:
“Ramon... O que houve? Está pálido.”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Ouvi umas vozes...”
COM. DARIO REIS:
“Eu não ouço nada. E meu sistema de microfones externos está em ordem. Talvez algum sobrevivente tenha falado rapidamente pelo intercomunicador de bordo, e não percebi.”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Não, não... Algo muito baixo, quase abaixo do nível de audição... Não está ouvindo mesmo? Um murmúrio baixo, como... Como... Uma prece, talvez, um falatório baixo e repetitivo...”
COM. DARIO REIS:
“Prece? Não! Não ouço nada. Sua mistura respiratória está bem?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Verificando... Estou bem. Não é delírio, há um som sim. Bem, detectamos fontes de energia funcionando aqui. Talvez algum aparelho ainda ligado, ou alguma gravação em um compartimento longe daqui, quem sabe? Mas tem alguém murmurando algo aqui dentro...”
COM. DARIO REIS:
“Talvez teus ouvidos sejam melhores que os meus. Temos menos de quinze minutos para alcançar o equador da esfera e preparar uma escotilha externa para o pessoal da outra nave entrar. Consegue ignorar o som e seguir adiante?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Mas é claro. Perdi o medo do escuro aos oito anos de idade. E as tais vozes ainda não estão me mandando matar ninguém, comandante.”
Mebarak sorri, e Reis o observa por um momento, e então dá de ombros, com um meio sorriso, e seguem por um corredor lateral. E a escuridão, regozijando-se e correndo, faminta e formada por montes de seres feitos de treva, vai atrás dos dois homens, devorando as réstias de luz que eles deixavam para trás.
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"PARTE IV
NAS SENDAS ESCURAS: O BARQUEIRO.
5 HORAS E 46 MINUTOS PARA O PRIMEIRO IMPACTO"
O VAZIO SALPICADO DE ESTRELAS, AO FUNDO O SOL BRILHA POUCO ACIMA DA TERRA, QUE É VISTA DO TAMANHO DE UMA MOEDA. RECUANDO, AS ESTRELAS, O SOL E A TERRA SE DISTORCEM, SUJOS, E PERCEBEMOS O GROSSO VIDRO DE UMA ESCOTILHA, E RECUANDO AINDA MAIS, DOIS HOMENS TRABALHAM NESTA ESCOTILHA, DEITADOS CONTRA ELA.
Os dois homens estavam agora na área do equador da esfera, “deitados” na superfície interna do casco exterior, pois a gravidade artificial no equador da esfera era na realidade força centrífuga, que os obrigava a ficarem em pé contra a face interna da gigantesca bolha de aço. No “chão”, sob eles, jazia a escotilha externa. Eles haviam despressurizado a câmara em que estavam, e Mebarak usava um sistema portátil de computador pouco maior que a palma de sua mão, e fino como uma prancheta, para acessar os sistemas eletrônicos de travamento da escotilha externa. Reis forçava, resmungando um pouco, o sistema circular de travamento. O rádio ainda não funcionava, mas o procedimento de entrada do pessoal da outra nave de busca e salvamento havia sido definido antes da falha total do rádio de longa distância. Eles tinham que abrir aquilo ali para que os outros entrassem.
COM. DARIO REIS:
“Nnnnnn... Ok, está abrindo... Mebarak, e as vozes?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Ainda estão lá... Mas estão mais indistintas.”
COM. DARIO REIS:
“Devemos estar longe da fonte agora. Ainda bem que isso abriu rápido. Em alguns minutos eles chegam aqui...”
Alguém! Um traje! Um corpo? As luzes internas de um capacete formam sombras nos olhos dela, como se as órbitas fossem profundas e horrendamente vazias. Por um segundo Ramon congela, e Reis tenta se afastar da porta de um salto. Então a pessoa envolta no traje espacial começa a entrar, e estende a mão. Mebarak hesita, mas acaba por tomar a mão da mulher, que se projeta para dentro da esfera. Reis é o primeiro a falar:
COM. DARIO REIS:
“Como fez o trajeto da RX7 até aqui tão rápido?”
DRA. SHARON:
“O caminho foi fácil. Muitas estruturas de apoio. Assustei vocês?”
TEN. RAMON MEBARAK:
“Eu... Creio que sim... Não esperávamos que você viesse tão rápido.”
COM. DARIO REIS:
“Veio sozinha?”
DRA. SHARON:
“Nunca estou só.”
COM. TALES LUCANO:
“Podem me dar um ajuda aqui?”
Outro astronauta entra pela escotilha. Novamente Mebarak estende a mão e ajuda o novo tripulante a ficar de pé na parede interna da esfera metálica. Todos se entreolham por um momento, então Lucano se apresenta:
COM. TALES LUCANO:
“Tales Lucano, se precisarmos destruir a esfera, eu farei isso, sou perito em explosivos.”
COM. DARIO REIS:
“Comandante Dario, estou no comando desta missão.”
DRA. SHARON:
“Sharon. Sou médica.”
TEN. RAMON MEBARAK:
“Eu sou engenheiro de sistemas... Ramon. Vamos andando? Para isso acabar logo... Ei, Dario, as vozes... Pararam...”
COM. TALES LUCANO:
“Vozes?”
COM. DARIO REIS:
“Explico no caminho. Achamos que existe uma fonte de áudio funcionando em algum lugar distante desta esfera. Se o som parou, acho que isso é um bom sinal. Estamos ficando calmos por aqui, Ramon... Bem-vindos... Doutora, comandante... Vamos.”
Sharon olha para Mebarak de forma enigmática, e ele devolve o olhar. Enquanto isso Reis fecha a escotilha externa, indo em direção ao centro da esfera. Lucano lança um olhar para a mulher, e murmura, enquanto mergulham na escuridão interna:
COM. TALES LUCANO:
“Médica...”
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"PARTE V
NAS SENDAS ESCURAS: MORTE COMO COMEÇO.
4 HORAS E 53 MINUTOS PARA O PRIMEIRO IMPACTO"
MAIS UMA VEZ OS CORREDORES ESCUROS. AGORA SEM OS TRAJES, DEIXADOS PARA TRÁS PARA QUE ELES GANHASSEM AGILIDADE, OS QUATRO ASTRONAUTAS CAMINHAM SEGUINDO OS FACHOS AZULADOS DE SUAS LANTERNAS. NOVAMENTE A ESCURIDÃO A VOLTA DELES PARECE SE RETORCER, ENQUANTO OS HOMENS E A MULHER ULTRAPASSAM O MAIS RÁPIDO QUE PODEM CORREDORES, PASSADIÇOS, ESCOTILHAS, E UM OUTRO SEM NÚMERO DE ACESSOS NO LABIRINTO INTERNO DA GRANDE ESFERA.
Os três homens seguem a frente. A mulher vem por último. Vez por outra Lucano lança um rápido olhar para ela, pois ele está logo à frente de Sharon. Há muitos minutos todos caminham sem dizer uma palavra, oprimidos pela escuridão, e pelos sons. As vozes que enervaram Mebarak se calaram, mas outros barulhos pareciam aumentar e se diversificar, à medida que mergulhavam mais e mais na esfera. Sons de ranger, como se o metal da esfera estivesse se rasgando lentamente em algum lugar. Às vezes um chicotear denotava que tirantes de aço se rompiam aqui e ali, explodindo em um grito metálico.
COM. DARIO REIS:
“Ramon, acha mesmo que foi uma boa ideia entramos sem os trajes pressurizados?”
TEN. RAMON MEBARAK:
“A estrutura geral da esfera parece bem comprometida, mas não detectei nenhuma rachadura no casco, nem vazamento de pressão interna. Acho que seremos mais rápidos sem os trajes.”
COM. TALES LUCANO:
“Entrar e sair bem rapidamente parece ser o que quer, não é engenheiro?”
Mebarak se vira para Lucano com cara de poucos amigos, mas um violento estalar seco faz com que ele largue a lanterna. Reis se vira para eles (ele era o primeiro da fila), mas Ramon tentava pegar a lanterna, Tales havia desaparecido, e Sharon mantinha o facho de sua lanterna direto para frente, cegando Dario. Por um momento reinou uma confusão de luz e escuridão, e as vozes desencontradas:
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“O que houve? Quem é? O que é isso? Tire a luz da minha cara, doutora!”
DRA. SHARON:
“Lucano. Ele se foi...”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Lance a luz aqui! Preciso achar minha lanterna! Está escuro! Algo o atacou!”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“O que foi isso, Ramon? Explodiu algo? Quem atacou?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Ali! Um cabo de aço se rompeu!”
DRA. SHARON:
“Achei o comandante Tales.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Onde? Mostre!”
Mebarak acha sua lanterna, que havia se desligado. Ela a ativa rapidamente, ilumina por um breve momento o cabo de aço recém partido que balança lentamente em um canto, e os fachos de luz convergem para se unir ao de Sharon, e iluminam Tales. O comandante jaz deitado no chão em um canto, não se vê nenhum ferimento, apenas o peito do macacão de Lucano está sujo de graxa em um tira que cruza o peito. A médica se agacha rapidamente, e examina o homem, dizendo por fim, em seu tom monocórdio:
DRA. SHARON:
“Está morto. Ao que tudo indica a pancada do cabo de aço não o cortou, mas provocou alguma concussão, ou parada cardíaca. Vou esclarecer na autópsia.”
Ocorre um minuto de silêncio, quando eles se entreolham.Dario mais uma vez ilumina o cabo de aço, e novamente, ele tem a impressão de ver a escuridão em volta do cone de luz de sua lanterna se contorcer.
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Eu... Deveria ter previsto isso...”
DRA. SHARON:
“Ninguém prevê esse tipo de coisa, Ramon.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Ela tem razão.”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Vamos levar o corpo para a nave...”
DRA. SHARON:
“Sejamos práticos: temos pouco tempo. Vamos ao centro da esfera, verificar se podemos ativá-la e tirar ela da rota de colisão. Quando voltarmos, levamos o comandante Lucano conosco.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Seu pragmatismo é impressionante, Sharon.”
DRA. SHARON:
“Ossos do ofício.”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Dario, acho boa ideia terminar logo a missão...”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Ok. Vamos em frente. Tem certeza de que achamos Lucano quando voltarmos?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Estou mapeando os corredores em meu PAD. Vamos voltar exatamente por onde entramos.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Vamos seguir em frente. Ramon, as vozes...”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Está ouvindo?! Consegue ouvir?”
DRA. SHARON:
“Ignorem. Vocês precisam ignorar e focalizar na missão.”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Sharon, não está ouvindo?”
DRA. SHARON:
“Não, Ramon. Alucinação auditiva. Ouça, comandante, vocês estão sob forte estresse. Esta é a hora de por em prática o treinamento que tiveram, e se concentrarem na missão. Confiem em mim.”
Há um silêncio constrangido. Então Dario começa a caminhar de novo em direção ao centro da esfera, seguido rapidamente pelos outros. Sharon lança de longe um último raio de luz sobre o corpo de Lucano. O braço do homem, que a médica pousou sobre o próprio colo do morto, começa e escorregar lentamente em direção ao piso, palma para baixo, quase como se ele tentasse se apoiar. Então Sharon parece ficar nervosa, e se volta para os outros, apressando o passo.
DRA. SHARON:
“Depressa. Temos pouco tempo.”
TITLE CARD:
"PARTE VI
NAS SENDAS ESCURAS: O VALE DA MORTE.
3 HORAS E 25 MINUTOS PARA O PRIMEIRO IMPACTO"
CAMINHAM NA ESCURIDÃO, AS QUATRO ALMAS, NA SUPERFÍCIE MAIS INTERNA DA ESFERA, ONDE EXISTE UM MUNDO CURVO, UMA PLANÍCIE ESCURA, COBERTA POR UMA PAISAGEM ANTES VERDEJANTE, COMO UM VASTO PARQUE, AGORA CHEIA DE GRAMA TURVA, E ÁRVORES MORTAS E RETORCIDAS VIVENDO AS CUSTAS DA LUZ ESMAECIDA QUE O NÚCLEO DA ESFERA AINDA PROJETA. A ECOSFERA INTERIOR É UM MUNDO MORIBUNDO, EM SEUS ESTERTORES, MERGULHADO EM SEMI ESCURIDÃO.
Bem no centro de tudo, acima dos astronautas, está o núcleo de energia da esfera. A primeira vista encarar aquilo foi chocante, e os homens ainda olhavam para ele com um temor respeitoso. A médica nem sequer olhava para aquilo. O núcleo é uma esfera também, bem no centro absoluto da esfera Bernal, e é de fato uma visão sombria, como que uma grande (cera de vinte metros de diâmetro) bolha de água obscura, turbulenta, dentro da qual explodiam silenciosos relâmpagos azulados. Eram estes relâmpagos que emprestavam o resto de luz àquela paisagem em eterno anoitecer
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Já viu um núcleo de energia assim, Ramon?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Nunca. Ele está em perfeito equilíbrio no centro de gravidade da Bernal. Parece uma bolha de plasma.”
Enquanto eles olham para cima, e apontam para lá suas lanternas (a luz sobe e refrata de formas estranhas e fantasmagóricas), Sharon gira o facho de sua lanterna à volta deles, uma volta completa, partindo de um afloramento de rocha próximo, passando pelos dois homens, e voltando ao afloramento, mas pouco antes de chegar passam por silhuetas humanoides na distância obscura, quase no limite da luz de sua lanterna. Assustada, ela volta rapidamente a luz, e por um segundo não vê nada, então ao voltar ao afloramento de rocha, vê as coisas odiosas sobre ele! Sedentas, horrendas!
DRA. SHARON: (Vozes Murmurando)
“Deus do céu! Nos proteja!”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“O que foi, Sharon?”
DRA. SHARON:
“Nada! Acho que aquele cubo negro lá na frente é alguma unidade de controle, veja.”
Os homens veem o quadrado negro, à distância. Anima-se de terminar logo com aquilo, e sair depressa daquele mundo morto, se apressando sem mais conversar a seguir naquele rumo. Em mais alguns minutos estão de frente para o cubo, Ramon se senta em uma pedra próxima, e respira fundo várias vezes.
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Ei, Ramon, está bem?”
DRA. SHARON:
“Deixe-me ver você...”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Estou tendo um pequeno ataque de pânico. Mas estou conseguindo me controlar, tudo bem. Acho que meu medo de escuridão não passou... E essas malditas vozes que não calam.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Preciso que veja se consegue ativar esta unidade de controle.”
DRA. SHARON:
“Precisamos muito de você, Ramon.”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Tudo bem... Deixe-me ver... É um núcleo remoto de computador, quer dizer que em algum lugar lá atrás tem uma sala de controle...”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Não temos tempo de procurar. Dá para operar isso daqui?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Sim, esta é uma unidade bem antiga, mas tem uma interface local aqui, olhe... Uma conexão padrão StormWire 2.1. Trouxe algumas, mas por azar não tenho uma 2.1 aqui. Tenho que voltar a nave e pegar um adaptador para meu PAD se conectar com isto.”
DRA. SHARON:
“Seus batimentos cardíacos estão acelerados, acho bom não se esforçar demais.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Ok. Eu vou. Onde estão as ferramentas que precisa?”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Tudo bem, você é mais rápido que eu... Me trás a maleta de interfaces. É pequena, e está numerada com o código INT-32, você a encontrará no armário 2 da engenharia da Abaddón.”
DRA. SHARON:
“Comandante, por favor, seja rápido. Mas não dê ouvidos ao que encontrar pela frente. Essa escuridão está mexendo com nossas percepções, não vá se perder.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Minha preocupação com a missão é maior que o resto. Perdemos nosso técnico em explosivos, e temos cerca de 3 horas para dar um empurrão nessa esfera para longe da Tsien! Se não conseguirmos, teremos que explodir a RX7 junto com essa esfera.”
TEN. RAMON MEBARAK: (Vozes Murmurando)
“Concordo, é a única maneira de acabar com isso sem um especialista aqui.”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Programa seu PAD para me mostrar o caminho de volta, e me passe ele. Vou indo, esperem aqui.”
E Dario começa a correr pela planície curva, seguindo o caminho indicado pelo PAD em sua mão. Mebarak, ainda sentado na pedra, e Sharon, silenciosa e vigilante, em pé ao lado dele, ficam olhando o comandante desaparecer e ser engolido pela escuridão coleante.Durante o trajeto, Dario é assombrado por vultos e sussurros, mas prossegue, aparentemente inabalável. Aos poucos ele vai cedendo, e parece ter dificuldades de respirar. A energia de sua lanterna está cada vez mais fraca, e é com ela já quase se apagando, e com a sensação de que a escuridão o está tentando agarrar, que o comandante Dario percorre os corredores.
TITLE CARD:
"PARTE VII
NAS SENDAS ESCURAS: LÁZARO.
2 HORAS E 48 MINUTOS PARA O PRIMEIRO IMPACTO"
OS CORREDORES PARECEM NOVAMENTE A GARGANTA ASQUEROSA DE UM MONSTRO, OU TALVEZ O INTERIOR DE UMA IMENSA SERPENTE QUE OS ENGOLIU. A VOLTA, PELAS PAREDES, HORRORES SEM NOME SE LANÇAM SOBRE O ASTRONAUTA, PROTEGIDO POR UMA RÉSTIA DE LUZ.
O comandante Dario se arrasta pelos corredores, se esgueirando entre escuridões pegajosas e coleantes, arfando sem ar, e suando copiosamente, tentando manter-se concentrado em chegar a nave. Ele chegou a sua nave, pegou a maleta que seu engenheiro precisava, e colocou nova bateria na lanterna, mas parece que a própria escuridão estava sugando a energia dela, que se exauria rapidamente. Dario sacode a lanterna e apressa o passo. Mas subitamente o comandante congela. Sua lanterna se paga lentamente diante de seus olhos aterrorizados, e as vozes horrendas aumentam tremendamente, e as criaturas da sombra começam a avançar sobre ele, cuja respiração está cada vez mais acelerada. Súbito, quando ele percebe que a luz vai se apagar, e que os monstros vão devora-lo no esquecimento da noite eterna das entranhas da esfera, ele fecha os olhos, e grita... Mas nada acontece. Ele abre lentamente os olhos, e percebe que está iluminado pelo foco de uma outra lanterna. Alguém veio em seu encontro.
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Ramon?”
COM. TALES LUCANO: (Vozes Murmurando)
“Comandante! Dario! Dario! Graças a Deus!”
Foi subitamente que Dario viu que quem segurava a lanterna era um homem morto, um homem morto que o agarrava pela manga do traje, e parecia em desespero.
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Porra! Porra! Porra, me solta, me solta, meu Deus! Meu Deus!”
COM. TALES LUCANO: (Vozes Murmurando)
“Graças a Deus! Eu encontrei você! Estava perdido na escuridão!”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Sai de perto de mim! Me solta! Você ta morto!! Você morreu!”
COM. TALES LUCANO: (Vozes Murmurando)
“Não! Não! Não! Olhe, eu sou de carne e osso! Toque meu braço, porra! Estou vivo! Estou vivo!”
Tales agarrava a mão de Dario, que ameaçava soca-lo, e fazia o comandante da Abaddón tocar seu braço e seu rosto. Tales estava em frenesi, e Dario quase tendo um colapso nervoso, mas aos poucos o comandante Reis foi se controlando, então agarrou os ombros de Tales, dizendo:
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Eu vi você morrer. Sharon disse que morreu!”
COM. TALES LUCANO: (Vozes Murmurando)
“Estou vivo! Essa mulher que vocês trouxeram está tentando enganar todo mundo! Estou vivo! Ela nem deve ser médica mesmo...”
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Ei! Calma! Como assim ‘nós trouxemos’? Sharon veio com você!”
COM. TALES LUCANO: (Vozes Murmurando)
“Merda nenhuma! Essa maluca estava aqui quando cheguei!”
Dario ficou mudo. Por um longo tempo ficou agarrado à lanterna e ao ombro do homem na sua frente, sólido, real. Reis tentou se lembrar da chegada da mulher, e sua expressão foi ficando mais e mais pálida conforme ele lembrava de que achou estranho que a mulher chegasse tão rápido a bordo, pouco depois de a outra nave chegar. Foi rápido demais. Impossível. Ela estava do lado de fora da porta o tempo todo, e quando Tales chegou ela já estava dentro da esfera, por isso ele pensou que ela havia vindo na Abbadón.
COM. DARIO REIS: (Vozes Murmurando)
“Merda! Ramon está sozinho com ela, ela pode pegar ele pelas costas, e acabar com a esfera!”
Dario tomou a lanterna de Tales e correu, desesperadamente pelo túnel escuro. Atrás dele Tales tentava o acompanhar, correndo também, e berrando:
COM. TALES LUCANO: (Vozes Murmurando)
“Não! Vamos embora! Me leve para fora! Me dá essa luz! Ele está morto, teu engenheiro já ta morto! Filha da puta!!! Volta!”
Dario correu o máximo que pode, por todo o caminho de volta, as vezes ouvindo Tales xingando ele atrás de si, as vezes ouvindo gritos de terror do comandante da RX7, mas quando se virava, via o homem vindo correndo atrás de si, e continuava em frente.
TITLE CARD:
"PARTE VIII
NAS SENDAS ESCURAS: A FERIDA.
1 HORAS E 08 MINUTOS PARA O PRIMEIRO IMPACTO"
O NÚCLEO DA ESFERA ARDIA EM UM PULSAR ASSOMBRADO E ENSANGUENTADO, PINTANDO A PLANÍCIE DE TONS SANGRENTOS. ONDE A LUZ SANGRENTA TOCAVA, BOTAVAM SOMBRAS, QUE DEPOIS SE CONVERTIAM EM PESSOAS FERIDAS, CORRENDO, ENCENANDO O MOMENTO DE SUAS MORTES HÁ TEMPOS, QUANDO A ESFERA SE PERDEU PELA PRIMEIRA VEZ.
Foi quando “eles” começaram a agarra-lo. Dario estava percorrendo a planície, quando percebeu que o núcleo de energia acima dele se incandesceu com uma luz mortiça, venosa e fantasmagórica. A planície então estava repleta de pessoas. Havia gente correndo apavorada por toda parte, e alguns muito feridos e descarnados. Havia fogo, havia explosões. Mas não havia um único som a não ser um pulsar surdo e assustador que vinha do núcleo de energia lá em cima. Por um momento, Dario divisa o cubo negro, e vê a silhueta de Ramon trabalhando nele. O comandante então perde o senso de direção, e começa a ser contagiado pelo pânico das almas perdidas ali, e começa a gritar, então alguém toca seu ombro, ele se vira, pronto para bater com a lanterna:
COM. DARIO REIS: (Vozes Gritando! Gritando de Horror! De Dor! De Pavor!!)
“Ahhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!”
Mas dedos suaves encostam-se a seus lábios. Sharon, no meio da turba irada de pessoas morrendo, segura o braço de Dario, que hesita em bater nela. Então a médica diz:
SHARON:
“Logo você estará totalmente louco. Mas ainda é um homem prático e sabe que não tem nada a perder... Confie em mim, e feche os olhos, vou te ajudar a não ver essa gente por um momento.”
As pessoas estão sujando Dario com sangue. Ele primeiro faz uma expressão furiosa, e então a escuridão começa a engolfá-lo, e seus olhos vão mudando, de fúria a terror, e sua boca se contorce em um esgar, então ele pisca, e sua expressão é a de um menino morto de medo quando ele vai fechando lentamente e forçosamente os olhos...
DRA. SHARON:
“Abra os olhos... Vamos, abra os olhos...”
Ele abre os olhos, e ouve o mais tenebroso silêncio, e ainda assim fica aliviado por não ouvir mais os que estavam morrendo. Lágrimas escorriam de seus olhos, então ele empurra a mulher para longe de si, e percebe que está ao lado de Ramon, que trabalha no cubo negro. Pouco mais à frente, Tales Lucano está agachado no chão, chorando, balbuciando algo. Não há mais ninguém na planície, apenas o núcleo pulsando, incandescendo em vermelho. Ramon olha para Dario, pega das mãos trêmulas do comandante a maleta, prepara seu PAD, e enquanto aciona a interface, ele diz:
TEN. RAMON MEBARAK:
“Vou desativar isso, comandante. Essa coisa não é um núcleo de energia. É um ferimento, um corte no espaço. Tem que ser cauterizado!”
SHARON:
“O núcleo vai disparar uma rajada de plasma, só que desta vez o engenheiro aqui vai calcular a força do pulso, para fechar a ferida para sempre.”
COM. DARIO REIS:
“Ramon, se essa coisa bater na Tsien, muito vão morrer...”
TEN. RAMON MEBARAK:
“Se o núcleo se abrir totalmente, ele vai atravessar a Tsien, e vai cair na Terra, e toda a superfície do planeta vai ficar igual a esta planície, um gigantesco limbo de gente presa entre duas dimensões, eternamente morrendo.”
SHARON:
“Não há saída, essa ferida purulenta tem que ser fechada aqui.”
com uma raiva indisfarçável no olhar, o comandante Reis fitou Sharon, que ficou impassível diante da ira do homem. Então o primeiro imenso lampejo branco do núcleo iluminou toda a planície por um segundo, e todos sentiram a alma queimar, e gritaram. Dario sentiu-se sendo erguido por alguém, e percebeu ser seu amigo, Ramon, que dizia, em uma voz longínqua, pois parecia que a cada pulso de luz branca, a própria luz abafava o som:
TEN. RAMON MEBARAK:
“Vamos! Vamos embora! Fizemos tudo que pudemos!”
E desataram a correr, todos, correndo como se estivessem sendo seguidos pelo próprio fogo do inferno. Então um tremendo lampejo de luz torna tudo branco.
TITLE CARD:
"PARTE IX
NAS SENDAS ESCURAS: A VERDADE DERRADEIRA..."
A INTENSA LUZ PARECEU PREENCHER E DESINFECCIONAR CADA MEANDRO DA ESFERA, PREENCHENDO E QUEIMANDO A ESCURIDÃO CHEIA DE PESADELOS. AGORA FINALMENTE A LUZ DIMINUÍA, E OS ASTRONAUTAS EM FUGA CHEGAVAM, DESESPERADOS, AO ÚLTIMO COMPARTIMENTO ANTES DA SALA DA ESCOTILHA QUE LEVAVA PARA FORA DA ESFERA.
Eles precisavam passar daquela porta, precisavam entrar ali, vestir seus trajes, e sair. Nem tentaram chegar ao anel de atracação, ele estava longe. Sairiam o mais rápido possível daquela esfera, e tentariam chegar a nave por fora. Até ficar a deriva no espaço era melhor que morrer ali. Mas de algum modo a última porta antes dos trajes e da liberdade, estava lacrada, e de longe, de trás deles, um terrível rumor, e um ranger terrível de metal, os impelia a fugir antes que tudo fosse destruído, ainda assim, não conseguiam abrir a penúltima escotilha antes do espaço e da liberdade.
COM. DARIO REIS:
“Eu não fechei essa merda assim! Isso parece que foi soldado!”
SHARON:
“Calma, há uma outra saída, e eu vou mostrá-la a vocês.”
TEN. RAMON MEBARAK:
“Meu Deus! Olha a escotilha lá embaixo! Onde foram parar as estrelas?!”
COM. TALES LUCANO:
“Não! Eu não vou morrer aqui! Eu não vou morrer aqui!”
SHARON:
“Não precisa mais se preocupar com isso. Assim que ficarem calmos, vão entender.”
COM. DARIO REIS:
“Cala essa maldita boca, e ajuda a abrir essa escotilha!”
SHARON:
“Ela não pode mais ser aberta, Dario. Ela não dá para lugar algum. Vou mostra a saída...”
TITLE CARD:
"PARTE X
NAS SENDAS ESCURAS: DEIXAI AQUI, Ó VOZ QUE ENTRAIS..."
A INTENSA LUZ DO NÚCLEO JÁ SE APAGA, E A PLANÍCIE A VOLTA DO NÚCLEO DE CONTROLE COMEÇA A VOLTAR A ESCURIDÃO, QUE A ENGOLIA, COMO SE ELA, A PLANÍCIE, E TUDO MAIS, JAMAIS TIVESSEM EXISTIDO.
Enquanto as últimas réstias de luz se esgotam, percebemos que tudo parece estar envolto em uma luz mais suave, como a luz do luar, e que a planície não está de todo deserta, existem três homens ali, estendidos no chão, pegos pelas costas pela tremenda rajada de plasma do núcleo, os homens jazem, mortos, Dario, Ramon, e Tales. Mas ainda assim, nossa visão deste mundo moribundo passeia pelos corredores, perfazendo o caminho agora de fuga, e passa pelas almas dos homens mortos, que tentam, desesperadamente e em vão, abrir uma escotilha que jamais os deixará sair. Atravessamos a porta de aço, e vemos os rostos desesperados das almas que estão sendo levadas da vida no visor da escotilha trancada. Tudo está ficando escuro, enquanto passamos pelas silhuetas dos trajes espaciais. Então mergulhamos em direção ao chão, e atravessamos a última escotilha, enquanto os rostos na janelinha lá atrás se perdem na escuridão, e estamos fora da esfera, e nos distanciando dela, longe, cada vez mais longe.
CONTROLE DA MISSÃO DE BUSCA E SALVAMENTO:
“Abaddón RX4, ainda não recebemos seus relatórios. Estamos detectando uma perda considerável de massa da esfera... O que está acontecendo por aí?”
Lentamente a esfera mergulha de novo no esquecimento, levando consigo os homens que foram escolhidos por alguém do outro lado para fechar este caminho entre os mundos. Lentamente a esfera vai se desmaterializando.
CONTROLE DA MISSÃO DE BUSCA E SALVAMENTO:
“Abaddón RX4! Onde vocês estão? Não temos contato de radar! Nós perdemos eles...”
FIM
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Aqueron (Roteiro de Telefilme) de Wagner RMS está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional. Podem estar disponíveis autorizações adicionais às concedidas no âmbito desta licença em contato.c7i@gmail.com.
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Mais uma matéria no nosso site da série de três artigos sobre possibilidades científicas de viagens mais rápidas que a luz (MRL) que possam nos levar às estrelas e que sejam úteis se você quer escrever sobre jornadas além do nosso sistema solar.⠀ ⠀ Por Wagner RMS. ⠀ LINK: Aqui
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Passando em uma rua, por um muro, o lembrete: independente do meio, escreva sempre com paixão, humanidade e honestidade.
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We no longer live without our smartphones, imagine when this addiction gets worse. Special thanks to the amazing Producer Lívia Pinaud for reviewing the translation of the short story into English. And hey, reader, thank you so much for all the publicity you can do about my work, you live in my Heart.
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Nossa Webserie OTHERSIDE foi selecionada para o Minnesota WebFest 2020! Mais um reconhecimento para as Criativas e Criativos brasileiros!!! Parabéns Mestre Diretor @flaviolangoni e Mestra Produtora @livia_pinaud_audiovisual ・・・ 🏅 @mnwebfest ・・・ OTHERSIDE is a Sci-Fi / Fantasy anthology webseries that dives into events that go beyond our imagination. Each stand-alone episode tells a different story. Each episode uses a different cast and crew. Minnesota WebFest 2020 Official Selection OTHERSIDE is full of drama and intrigue, taking the audience on journeys to realms unknown. The series is available to watch on @Flixxok! Link in @livia_pinaud_audiovisual and @flaviolangoni . __________ #novafriburgo #novafriburgoparaomundo #kilmersondreams #WagnerRMS https://www.instagram.com/p/CE5MfhND7jN/?igshid=1qr3qasvow39c
“Devemos renunciar ao nosso ceticismo apenas em face de evidências sólidas. A ciência exige uma tolerância à ambiguidade. Onde somos ignorantes, recusamos ceder à crença. Qualquer que seja o aborrecimento que a incerteza gera, serve a um propósito maior: nos leva a acumular dados melhores. Essa atitude é a diferença entre ciência e tantas outras coisas. A ciência oferece pouco em termos de emoções baratas. Os padrões de evidência são rigorosos. Mas, quando seguidos, permitem que enxerguemos longe, iluminando até uma grande escuridão. ” _ Carl Sagan, Pálido Ponto Azul, 1994.
“We must surrender our skepticism only in the face of rock-solid evidence. Science demands a tolerance for ambiguity. Where we are ignorant, we withhold belief. Whatever annoyance the uncertainty engenders serves a higher purpose: It drives us to accumulate better data. This attitude is the difference between science and so much else. Science offers little in the way of cheap thrills. The standards of evidence are strict. But when followed they allow us to see far, illuminating even a great darkness.”
—Carl Sagan, Pale Blue Dot, 1994
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"Quando recebi o livro, fiquei com receio de que fosse mais um daqueles livros de vampiro 'sem pé nem cabeça', me enganei completamente! Esse livro é surpreendente!"_ Carol Ferreira, Blog Pequena Morena.
"Livro delicioso!!! Me prendeu desde o primeiro capitulo."_ Eu Amo Leitura.
"Livro muito inteligente, com frases bem construídas, trama intrincada e uma capa linda. Creio que teremos uma série de sucesso!"_ Debora Barroso, Cinderelas Literárias.
"Fiquei completamente hipnotizado pelo trecho que li no site do autor! (O livro Mônica é) Sexy, sombrio, inebriante, instigante, avassalador!"_ Gustavo Henrique, Leitura Virtual.
"Thriller político histórico e Terror! Isso que é ficção, (o livro Mônica) nos faz pensar que é exatamente o que o governo está fazendo!"_ SakuraUchiha, Avaliadora TOP 50 da Amazon.
"Mônica é totalmente poderosa e nas palavras de Beyoncé... Ela é uma 'Grown Woman', não precisa dar satisfações e segue suas próprias ideias."_ Sayd Alcantara, Friendzone.
"Gosto de personagens desafiadores, sarcásticos e insubordinados. Tudo o que encontrei em Mônica."_ Flávia Leles, Literatura Informal.
"Além da leitura ser envolvente, gostei muito das críticas feitas pelo autor à atual política do Brasil, em razão da corrupção."_ Maisanara, Viajando Pelas Páginas.
"Será que ali poderia existir amor (entre um humano 'comum' e uma Criatura da Escuridão)? Só lendo mesmo para vocês descobrirem isso!"_ Kelly Cominoti, Aventuras na Leitura.
"Mônica é abusadamente sexy."_ Telma Myrbach, Surtos Literários.
"O autor Wagner Ribeiro, já me conquistou criando uma personagem tão marcante como Mônica."_ Victor Tadeu, Desencaixados.
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— Merda! Merda, Mônica, por que fez aquilo?
A jovem mulher abriu os grandes, belos e expressivos olhos castanho-escuros, que a um momento estavam quase fechados, e sorriu francamente, ar de moleca zombeteira, colocando o indicador no lábio inferior e fazendo trejeito de geniazinha de antigo seriado de TV, enquanto pensava por um momento e então dizia, faceira:
— Impulso! Compulsão! — Mas o que ela queria mesmo com o sorriso brejeiro era que ele visse bem seus caninos, e encarasse a verdadeira natureza dela. Dane-se se ele sentia nojo, ela era o que ela era, e pronto. Aquele crápula arrogante haveria de engolir tudo o que Mônica significava, quisesse ou não.
O Agente Investigador Eduardo Araújo Weltman olhou para ela com desprezo, que ela devolveu acrescido de deboche e ironia, olhando-o de lado e dizendo para ele:
— Eu fiz meu trabalho, Edy. E você, pode dizer que fez o seu?
— Monstro… — Disse ele, entre dentes.
— Então o que vai fazer lá dentro diante da Comissão? Se fosse me crucificar, teria trazido consigo a gravação. Cadê a gravação?
Ele estreitou os olhos, e respirou profundamente, lentamente. Era um homem charmoso, de traços fortes e masculinos, temperado por um sutil ar sensual de atrevimento, e tinha o que as mulheres chamavam de um belo sorriso, e onde as mais atentas viam uma boca carnuda, convidativa. A cereja do bolo, segundo Mônica, era que Weltman era, no fundo, tímido.
Naquele momento, no entanto, ele estava sério, carrancudo. Parecia tentar dizer algo que não conseguia expressar. Ficaram se encarando, a meio metro um do outro, sentados na luxuosa antessala da Comissão. Ambos agentes, ambos cientes que seriam interrogados acerca de uma missão que acabou em um banho de sangue, e que isso talvez lhes custasse bem mais que as carreiras. Havia um clique-claque em algum lugar, de algum relógio fora de vista, e nada mais, apenas o silêncio. Mônica ameaçou dizer algo, mas Weltman se levantou e foi falando:
— Eu… Destruí o CD com a gravação. Mas fora isso, vou cumprir meu dever lá dentro. E pedir meu afastamento da DCOR (1) imediatamente. É através do DCOR que mantenho minha ligação com os Dragões Vermelhos.
Ela ficou olhando para ele por um momento, e não soube o que dizer. Não obstante sua aparência tão jovial, Mônica estava viva há sessenta e nove anos e, apesar disso, não sabia o que dizer enquanto ele afirmava que iria embora. Ficou então séria, não tinha vontade de sorrir, e deu de ombros. Se ele queria ir para o inferno, que fosse, disse com veemência para si mesma, na tentativa de se convencer que pensava de fato assim.
Então a ampla porta metálica da sala da Comissão se entreabriu, e um assistente pôs metade do corpo para fora. O jovem moço avaliou por um segundo a linda mulher sentada, cuja pele clara e os longos cabelos em tons castanhos profundos contrastavam sensualmente, e então olhou para o homem, dizendo:
— Agente Weltman? O senador Coriolano pede que o senhor entre primeiro.
Eduardo ajeitou a gravata de seu terno, e sem olhar para Mônica, fez um sinal impaciente para que o jovem auxiliar entrasse na frente, e entrou a seguir. Diante das costas largas do homem que iria enfrentar a temida Comissão agora, Mônica Alencar Deveraux deixou finalmente uma expressão triste tomar conta de seus grandes e belos olhos, e murmurou:
— Eu sei o que você vai fazer, seu idiota… Vai me salvar.
O depoimento a portas fechadas de Eduardo demorou cerca de duas horas. Então ele saiu, e passou por Mônica sem que trocassem uma palavra, mas mesmo sem olhar para trás, ela soube que ele havia parado no corredor e a olhava, as grossas sobrancelhas escuras vincadas de preocupação. Mônica sabia que era a agente mais destacada entre os Dragões, mas sabia também que era a mais controversa e a mais frágil diante da Comissão. Todos sabem que a Comissão tem ares de cordialidade e civilidade, mas que usa qualquer método para manter seus agentes na linha, e não raro julga pela morte dos agentes que acha perigosos para a instituição. E, sem a menor dúvida, Deveraux era a mais instável e perigosa peça atualmente em jogo.
— Boa noite, senhorita Deveraux. — Disse o senador Coriolano calmamente, enquanto retirava de uma pequena pasta alguns documentos, e um tablet, e os colocava sobre a mesa de ébano espelhado que estava a sua frente, entre ele e a aparentemente jovem agente. Ele não olhou para ela, que se sentava na cadeira solitária que ficava no centro do salão. Em frente a ela, feito juízes da vida ou da morte, os sete membros atuais da Comissão. Todos impassíveis, feito estacas afiadas apontadas para Mônica. Como a agente não respondesse, o senador ergueu o olhar aquilino, e repetiu com sua voz grave e soturna: — Boa noite, senhorita Deveraux…
— Boa noite. Aquilo ali no canto é um emissor laser?
— Sim, Deveraux. É uma solda laser industrial especialmente adaptada para emitir um único e intenso disparo, capaz de carbonizar você. A cerca de três metros em volta de sua cadeira há um campo invisível detector de movimentos. Se tentar se mover além deste perímetro, o laser vai mirar no seu corpo e disparar, tudo numa fração de segundo.
Mônica sorriu, sensual e fingindo-se divertida. Ela fitou o senador por debaixo de suas bem delineadas sobrancelhas, enquanto foi dizendo:
— Ah, mas para quê tudo isso? Eu sou apenas uma pobre menininha inocente. — E riu, um riso de menina mesmo. Pôde sentir os velhos se arrepiando de medo.
O senador desviou imediatamente os olhos dos de Mônica, e pigarreou incomodado, dizendo a seguir, ainda em seu tom monocórdio:
— Senhorita Deveraux, gostaríamos que nos fizesse um relato de suas atividades no desfecho da Operação Arani (2) onde a senhorita deveria apenas mandar um recado. — e ele frisou o termo, ela sabia, para que Deveraux lembrasse que eles possuíam o controle sobre a coleira dela. Seria uma coleira bem larga e folgada quando sua mãe, já bem idosa, e sua irmã, também muito velha, falecessem, pois talvez Mônica não ligasse tanto assim para filhos de sobrinhos. Talvez. A agente riu-se, com desprezo, e ele prosseguiu: — E acabou tomando para si a decisão sobre… Como deveria terminar aquela missão.
— Primeiro me diga o que Weltman disse.
— A senhorita veio aqui apenas responder…
— Senador. Eu vou lhe contar exatamente o que houve. Mas antes, olhe para mim…
Como Coriolano evitasse olhar para ela, Mônica respirou fundo, semicerrou os grandes olhos, concentrou-se em algo escuro dentro de si, e abriu a boca, falando com uma voz que era talvez a voz dos mortos, ou a voz inquietante do rumor assombrado de um oceano antigo, terrível e esquecido em algum recanto sombrio do Universo. Sua voz era um som apavorante, mas ao mesmo tempo hipnótico. Era um reverberar demoníaco, mas ao mesmo tempo belo, sua voz era tudo, menos humana, quando Mônica disse:
— Olhe para mim.
As gotas de suor começaram a brotar da testa do senador. Coriolano, o Coriolano Malvadeza ou o Sanguinário Gentil, como era chamado nos corredores do Senado, era um homem duro, firme e de grande poder, sua força de vontade era tremenda e notória, pois ele já fizera vergar presidentes, e mandara destruir mais vidas do que podia se recordar, ainda assim seu coração parecia querer rasgar o peito ao ouvir a terrível voz de comando daquela besta-fera em forma de mulher. Ele a odiava intensamente, nem sequer tentava esconder, mas como todos os outros da Comissão, devia saber que residia nela um trunfo de que não podiam dispor em seus planos para o futuro dos Dragões Vermelhos. Ela possuía um raro e genuíno dom sobrenatural. Até onde sabiam, nenhuma outra agência mundo afora possuía um ser como ela entre seus agentes.
— Olhe… Para… Mim.
Todos olharam para ela. Não havia um único par de olhos naquela sala e nas salas de vigilância, que monitoravam o lugar, que não tivesse se fixado na mulher alta, bonita e de aparência jovem e elegante, que estava sentada com sensual charme no meio da sala da Comissão. Mas por mais terrível e irresistível que fosse aquela voz horrenda e sedutora, Mônica não era onipotente, sua vontade não dominava completamente quem a ouvia, e vários guardas de segurança saíram das sombras nos cantos da sala, olhos vidrados nela, mas o instinto treinado os fazendo apontar diversos canos de fuzil direto para Deveraux. Coriolano, que olhava trêmulo de fúria bem diretamente para o olhar escarnecedor da agente, ergueu a mão, e os fuzis foram recolhidos, e ele, o senador, disse, num balbuciar quase selvagem:
— Weltman… Fez seu relatório… E disse que você não teve escolha senão entrar em conflito com todos, e que ele a ajudou a sair… E que você tentou ajudar a falecida agente Steiger, mas que os bandidos a esfaquearam… Figueiras está vivo e vai levar o aviso aos chefes dele… Agora, sua… Coisa… Diga como sobreviveu a tudo aquilo?
— Weltman pediu afastamento?
— Eu neguei.
— Sim… Sim… — Ela sorria — Na verdade o agente Weltman foi quem me conteve e me fez deixar Figueiras livre. Entenda, Coriolano, se me quer trabalhando para você, escreva no seu tablet aí, com suas mãozinhas nodosas, que Eduardo Araújo Weltman não é dispensável, ele…
— Como diabos você sobreviveu, porra?!!! — O grito salivante do senador foi tão súbito e violento, que Mônica se surpreendeu e calou-se, mas manteve o ar de zombaria que quarenta anos de treino lhe ensinaram a pôr no rosto quando queria se proteger do mundo. O senador tinha os olhos injetados e uma tal fúria que ela poderia jurar que ele também era, ou deveria ser um filho das trevas. Foi então que ela entendeu. Mônica olhou para ele longamente, enquanto Coriolano Malvadeza se recompunha e tomava das mãos de uma secretária um lenço e um copo de água. Em poucos momentos ele era novamente um homem elegante e sério, um político de carreira que se reelegeria vezes seguidas apoiado em seu carismático e paternal semblante e nas falcatruas políticas que sabia fazer como ninguém. Mas Mônica sabia muito bem o que ele desejava, e disse:
— Senador… Percebi algo muito interessante a seu respeito, e vou lhe contar. Você acha que eu sobrevivi aos tiros porque sou o que sou, e quer saber como eu o fiz. Pois o senhor deseja essa imortalidade, deseja ser como eu, não é? — E diante do olhar de asco contido e falso, e do silêncio muito esclarecedor de Coriolano, Mônica sorriu e disse, em sua ainda potente, mas agora bela e musical voz feminina, a sua voz natural: — Eu vou te contar então, senador do povo brasileiro, preste atenção que vou contar o que aconteceu naquela noite, mas não vou direto ao ponto, pois eu preciso deixar suas mentes atentas ao contexto. Era uma vez… Uma equipe da Polícia Federal que estava de campana na Bahia, vigiando de perto um político extremamente corrupto, o Deputado Antônio Bomeninno, há cerca de seis meses. No início objetivando apenas acumular provas contra ele para um eventual processo, se ele pisasse fora demais da linha demarcada pelo Governo. Mas os federais descobriram, quase sem querer, no meio do caminho, que algo muito grande estava sendo tramado por outro político, um tal Senador Figueiras, que era amante da mulher de Bomeninno, envolvendo propinas de milhões de dólares para manipulação de quem e como seriam feitos os softwares gerenciadores de novas versões das urnas eletrônicas no país.
— Sabemos de tudo isso…
— Avisei que não iria direto ao ponto, uma mulher precisa estabelecer contextos, Senador. — Aqui ela pausou com um sorriso entre falsamente simpático e verdadeiramente debochado — Bem, quando esta informação circulou pelos corredores da Federal, imediatamente os Dragões entraram em movimento, e encamparam a operação antes que a cúpula do Governo a mandasse para o limbo. Sabemos que é imprescindível para o bom funcionamento dos planos dos Dragões que os políticos corruptos que não estivessem nas mãos da organização fossem tirados do jogo. De modo que o que era apenas uma operação para acumular provas contra um ladrãozinho de quinta categoria, tornou-se um procedimento cirúrgico nosso, para extirpar outro bandido, de maior quilate. Para tanto os Dragões usaram o velho método de dar corda para que ele preparasse sua própria forca, então, quando ele buscou com intensidade contato com uma gigantesca empresa multinacional, os Dragões assumiram, infiltrando uma agente na negociação, chamada Érika Steiger, que para os gringos era uma especialista em negociações paralelas no Brasil, e para Figueiras, uma representante extra oficialmente contratada pela tal mega empresa. No fim das contas, para os Dragões, Érika deveria tirar o máximo de informação de Figueiras, e o deixar pronto para o abate. Mas não foi bem assim que tudo se desenrolou, os senhores sabem.
Ocorre que Steiger não enviava notícias há semanas, quando a Comissão mandou a equipe envolvida no caso preparar uma nova inserção de agente infiltrado na operação de Figueiras. Coriolano escolheu pessoalmente a agente especial Mônica Alencar Deveraux como a próxima infiltrada, e tomou a última mensagem de Érika como base para colocar Deveraux no esquema, pois Steiger afirmava que Figueiras procurava febrilmente um hacker que possuísse conhecimentos sobre os sistemas de segurança do Senado. Mônica foi treinada e instruída para saber quebrar os códigos de acesso, e lhe foi dado um hardware especial, uma chave, que a permitiria entrar no sistema do Senado brasileiro, e provar que era a hacker que Figueiras precisava. Mônica, indicada a um comparsa de Figueiras através de um contato também sob controle da Federal, conseguiu uma entrevista virtual com um representante do Senador, e provou ali ser capaz de ajudá-los, então deixou seu número de celular, e ficou aguardando o contato. Foram duas longas semanas em um hotel de luxo baiano aguardando o chamado. Ela, Mônica, se fazendo passar pela engenheira de software Carmem Luzia Rodrigues, a hacker Carmina, e Weltman junto com outros agentes dando-lhe cobertura, disfarçados como hóspedes do mesmo hotel.
Weltman já ouvira falar de Mônica, e já há muito tempo estava bastante curioso a respeito dela. Devia ter ouvido muitas das estranhas histórias que contavam acerca da agente sobrenatural, que lutava sozinha contra vários homens, que era uma mistura de lobisomem com curupira (3), e tinha voz de Iara (4) que congelava a alma. Eduardo havia sido policial civil no Rio de Janeiro, trabalhando na divisão de entorpecentes, teve que lidar com todo o tipo de monstros, alguns dos piores dentro da própria polícia. Não gostava de dizer-se corajoso, era antes disso capaz de respeitar profundamente seus oponentes, e por agir assim chegou mesmo a sobreviver em antros de violência e corrupção com a moral razoavelmente intacta. Era, sim, apesar do que dizia, um homem bom e corajoso, mesmo que um tanto embrutecido pela vida. Portanto, provavelmente não sentiu medo quando esbarrou com Mônica bebendo um drinque no bar do hotel, mas alguma profunda e respeitosa curiosidade. Mal tinha trocado meia dúzia de palavras formais com ela desde o início daquela operação, e aquela poderia ser a oportunidade de conhecê-la pessoalmente. Ela agitou a cabeleira escura, para jogar as mechas para trás, e deu nele uma olhada treinada, miúda e desdenhosa. Provavelmente Weltman a achou, naquele primeiro contato, uma mulher bonita, mas absolutamente normal. As aparências são enganadoras, na maioria das vezes, então o homem resolveu dar mais um passo, feito um gato curioso, e disse simplesmente:
— Boa noite.
— Posso arrastar você para o fundo do lago, agente… Iara, já deve ter ouvido falar… — murmurou ela, quase sem olhar para ele, bem baixinho, de modo que só ele pudesse ouvi-la. Sua boca pareceu divertir-se com as palavras, pois a imagem fugidia de um sorriso passou por ela enquanto falava.
— Gostaria de conhecer a pessoa por trás do rótulo. Posso? — Disse ele, incisivo, mas ainda assim mantendo um tom suave na voz, que deu a ela um pressentimento de que o atraente e charmoso agente poderia ser alguém que ela gostaria de conhecer melhor. Até aquele momento pretendia tratá-lo com a acidez arraigada com que tratava a todos, mas aquelas palavras duras, mas honestas, a fizeram mudar de ideia.
Ela ajeitou-se na cadeira alta do bar, fez um sinal para o barman que colocou uma nova taça de vinho sobre o tampo à sua frente, e ela se apressou a dizer: — Mais uma, por favor. — E voltando-se para Weltman: — Bebe um chadornay comigo, cavalheiro?
— Vinho? Sim, obrigado. — Disse Eduardo.
— Bem, mas que tal sentarmos em uma mesa e verificarmos o que pode ser feito acerca de rótulos, monsieur?
Ele aquiesceu, e ambos foram para uma mesa mais reservada. Mônica pediu e levou consigo a garrafa de vinho. A aparentemente jovem mulher pousou sobre a mesa a garrafa e uma pequena e provavelmente caríssima bolsa que trazia consigo à tira colo. Era um tanto fora de protocolo que, durante a missão, eles se falassem assim, mas Weltman precisava saciar sua curiosidade, e Mônica precisava se distrair durante aquela noite tão parada, conversando com alguém interessante.
— Sabe que Coriolano vai reclamar feito uma velha coroca quando souber que quebrou o protocolo vindo me dar o prazer de sua companhia, não sabe? — Disse ela com um sorriso jovial e leve. Ela parecia tremendamente descontraída, mais ainda assim Weltman podia perceber algo no olhar de Mônica que recendia a coisa antiga, pesada, como se ela tivesse visto mais coisas do que sua idade aparente permitiria, e que muitas dessas coisas tivessem sido bem ruins. O homem reconheceu um pouco do seu próprio olhar no dela.
— Respeito o velho, mas ele não está aqui. Ele que se dane, o Malvadeza. Vou tentar saber quem ele é outra hora. — E sorriram um para o outro, riso franco, enquanto se serviam de vinho. Então Weltman voltou a falar: — Pois bem, quem é você, Mônica?
Mônica ficou mirando Eduardo, como se estivesse estudando até que ponto o cara poderia aguentar a verdade, o que fez o homem sorrir para ela, um sorriso que muitos chamavam de sorriso canalha, mas que era apenas a franqueza nua da alma dele, dizendo "somos de carne e osso". A bela mulher colocou a taça em que bebia sobre a mesa, acompanhando o movimento com os olhos. Depois voltou a olhar para o homem na frente dela e, para total surpresa do sujeito, entoou, sorrindo delicadamente, em uma voz também delicada e docemente afinada:
— Talvez você não entenda, mas hoje eu vou lhe mostrar. Eu sou a luz das estrelas. Eu sou a cor do luar. Eu sou as coisas da vida. Eu sou o medo de amar. Eu sou o medo do fraco. A força da imaginação. O blefe do jogador. Eu sou, eu fui, eu vou… — e concluiu, apenas recitando a letra, e não mais cantando, sem sorrir, na verdade com um tom taciturno no olhar: — Eu sou a beira do abismo…
E então, mudando novamente, agora com a expressão mais pura e delicada no olhar antigo, Mônica baixou os olhos, e ficou observando, sem ver, a taça de vinho quase extinto.
Depois de um longo momento fitando a garota, Weltman voltou a respirar. Ele não sabia o que dizer. Não fora ali paquerar Mônica, seu objetivo não era tão primário assim, embora ela o estivesse atraindo mais e mais, mas antes queria conhecer a tal super agente, coisa necessária se iriam operar profissionalmente juntos. Ocorre que ela o estava encantando, depressa, e ele acabara de descobrir que não sabia o que fazer quanto a isso.
— Bonito. — Ele disse, enfim.
— Apenas o Raul, sujeitinho doido, mas muito legal.
— Fala com intimidade, é fã do trabalho do cara?
— Não, eu o conheci pessoalmente, e avisei a ele que aquela história de "Grã Ordem Kavernista" ia lhe custar o emprego. — Ela deu uma piscadela e riu, Eduardo riu também.
Ele, encarando o bom humor dela como uma piada sobre ter convivido e aconselhado um artista morto quando ela ainda deveria ser um bebê, e meio sem se aperceber o que ele próprio estava fazendo, mas agindo simplesmente porque precisava agir, pegou ambas as mãos dela nas suas próprias, por sobre a mesa, e ficaram se olhando longamente. Então Mônica disse:
— Você não quer fazer isso. Eu sou a beira do abismo, lembra?
— Quando entramos para os Dragões, eles nos dão as fichas das pessoas que vão trabalhar em nossa equipe, e a sua era vaga, quase incompreensível, como se você tivesse uma liberdade especial de colocar ali o que quisesse. Encontrei apenas alguns poemas escritos por você, e uma foto sua… Nunca vi aquilo. Eu confesso que reclamei com o cadastro, e eles me disseram que o Malvadeza em pessoa mandou deixar como estava.
— Ah! — Fez ela, repetindo sem perceber o lindo e singelo sorriso de moleca da tal fotografia, e, claro, tangenciando o assunto a respeito das liberdades especiais dela — Sei qual é. A foto. Ah, fui pega totalmente de surpresa naquela foto!
— Estava encantadora, mas o que me impressionou ainda mais foram seus pensamentos… Os poemas, reclamei mas li. Durante o período de adaptação, eu treinei com homens que já haviam trabalhado contigo, e eles falavam a respeito de uma mulher corajosa, que eles respeitavam, mas que temiam muito, eu podia ver o receio deles nas entrelinhas, eles não tinham só medo, tinham verdadeiro pavor de você. E eu dizia pra mim mesmo que aquilo não tinha nada haver com a mulher dos poemas. Então achei que eu gostaria de conhecer a verdadeira Mônica, com a qual finalmente eu vou trabalhar.
— Ninguém conhece.
— Eu desejo honestamente conhecer. A verdadeira. — E ele ficou olhando para ela, que lhe devolvia um olhar doce, a coisa antiga em seus olhos parecendo arrefecer, se fazer menina, uma menina que sonhava, como todas as meninas sonham.
Então, sem resistir mais nem um segundo, Weltman inclinou-se em direção dela. E a beijou. Um beijo em crescente, um beijo que começou brando, mas tomou ares de tempestade, como se um devorasse a boca do outro! Doçura, vinho, e hálitos saborosos e passionais misturando-se, em uma sensação formigante e inebriante que lhes tomava os corpos, aquecendo-os e atiçando a fome de quero mais e mais! A tempestade deu lugar a suavidade, e voltou a rugir, duas, três vezes, e ninguém estava contando mais depois disto. Quando, enfim e depois de longo e marcante beijo, o fôlego se acabou (mesmo que o ardor só estivesse começando) abraçaram-se, aconchegando-se um ao outro. Então Mônica, que pousou a cabeça no ombro do homem, pôde sentir o odor masculino dele, penetrante e atraente, um cheiro muito bom, excitante, quente, muito quente, que a envolvia numa sensação incrível de liberdade e submissão ao mesmo tempo, de segurança… Mas também, após um momento de inocência ardorosa, que passou rápido demais, Mônica pôde sentir a pulsação hipnótica e acelerada do sangue teso e passional de Weltman na jugular do pescoço dele, podia mesmo sentir-lhe o gosto exalando da pele.
Quando ela deu por si, percebeu que ansiava por beber da vida dele, e que o predador voraz dentro dela começava a vibrar, inflamando-se! Mônica, imediatamente, soube que ela não deveria e não poderia fazer aquilo, que não poderia sequer arriscar se apaixonar por ele, não poderia jamais amar de novo, e matar de novo! Foi neste instante que ela se desesperou, mais uma vez, com sua sina monstruosa: quando foi engolida pelas trevas, quando voltou do mundo das sombras e do ar, há mais de quarenta anos atrás, Deveraux passou a viver o estigma de sua fome medonha, capaz de matar quem lhe era indiferente, quem ela temia, mas também quem ela amava. Mônica sentiu crescer o angustiante horror de si mesma em seu coração! Subitamente levantou-se, apavorada e enojada de si mesma! A cadeira em que ela havia sentado caindo para trás, com estardalhaço, e os olhos de Weltman tentando entender o por quê daquele rompante. Ela sabia o que precisava dizer, e disse, não muito alto, mas com intensidade cortante:
— Já descobriu o gosto que eu tenho? Pode dizer aos outros rapazes que sou de carne e osso, pois deve ter apostado com eles que iria vir aqui me dar um pega e ver qual é, não foi?
— Eu não…
— Ah, me poupa, Weltman, você vai me dizer que é um cara que não julga as pessoas? Que não vai me crucificar também assim que descobrir o monstro que eu sou. Pois escreve aí, agente Eduardo… — Em seguida ela cantarolou novamente a música, com afinação, mas também com ácida ironia na voz: — Eu sou o sangue no olhar do vampiro.
E ela sorriu com um falso deboche, e saiu caminhando para longe com elegância, deixando o homem atrás de si entendendo muito pouco, e aborrecido por ter sido julgado sem direito a defender-se, e ainda mais contrafeito por causa da impressão de que ela brincou com ele durante aquele beijo. Em essência sendo um homem tímido, quando se tratava de relações, ele se sentiu um completo idiota, envergonhado por, pela primeira vez desde a juventude, se deixar levar por um momento bobo e passional, e embaraçar-se daquele modo com uma colega de trabalho. Pior ainda se sentia quando, olhando para dentro de si mesmo, percebia que a mulher não deixara nele uma impressão passageira.
Somente quando Mônica, por sua vez, entrou no elevador, e se viu absolutamente sozinha, foi que se permitiu chorar. Chorar por, há mais de quarenta anos, estar morta. Sentia-se e transpirava solidão, uma solidão que nenhum ser humano seria capaz de experimentar, enquanto humano. A mulher apoiou as costas no espelhado interior do elevador, e, torcendo para que ninguém entrasse (o que, dado seu estado e sua natureza sombria, afastaria mesmo qualquer um que não tivesse um motivo de vida ou morte, ou que possuísse força de vontade sobre-humana), olhou para o alto, como buscando um Deus que ela, sinceramente, almejava existir, e deixou lágrimas ardentemente dolorosas escorrerem-lhe pelas faces suaves.
Justo naquele instante seu celular chamou, com mensagem de Figueiras, marcando encontro com ela para a noite seguinte.
CONTINUA…
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Arani: do Tupi Guarani, significa "tempo furioso".
Curupira: Ser da mitologia brasileira que protege os animais e florestas, que protege os tesouros do Brasil.
Notas de Rodapé:
Iara: Outra criatura da mitologia brasileira, também conhecida como Mãe D'água, espírito de incrível beleza feminina, que atrai os incautos para afogarem-se nas águas de lagoas assombradas por ela.
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